Quando Ben Bussey disse a seus colegas que ia partir em busca de um lugar em que faz Sol o ano todo, não estava brincando. Esqueça os paraísos tropicais. Tente em vez disso algumas regiões na borda da cratera Peary, no pólo Norte da Lua. Usando 53 imagens obtidas em 1994 pela Clementine, sonda não-tripulada financiada pela Força Aérea dos Estados Unidos e pela Agência Espacial Norte-Americana (NASA), Bussey e seus parceiros da Universidade Johns Hopkins, de Maryland (EUA), encontraram algumas regiões altas nos arredores do pólo lunar em que a luz do Sol deve incidir sobre a superfície o tempo todo.
Sim, não importa se é verão, inverno, dia, noite, sempre há um solzinho por lá. “Áreas permanentemente iluminadas pelo Sol são locais ideais para a instalação de postos avançados lunares, pois têm energia solar abundante e são relativamente benignas termicamente”, escreveram os pesquisadores, num pequeno artigo que foi publicado na última edição da revista científica britânica Nature [www.nature.com]. E não é só isso: “Elas estão próximas a regiões permanentemente escuras, que podem conter gelo”. Todas as missões tripuladas até a Lua, realizadas pelos EUA entre 1969 e 1972, com o famoso Projeto Apollo, se dirigiram a regiões equatoriais, pela maior segurança oferecida em termos de trajetória, condução do pouso e monitoramento da missão. Mas esses lugares são bons para visitar, mas não para morar.
Durante o dia lunar que dura 14 dias terrestres, o sol incide fortemente sobre o solo, que se aquece a 100°C. À noite, a temperatura caí para -180°C. Construir uma base para astronautas lá exigiria materiais que conseguissem sobreviver intactos a essas oscilações térmicas brutais por longos períodos de tempo. Nos locais apontados por Bussey, em compensação, a temperatura é constante, estimada em aproximadamente -50°C. “Uma região com essa temperatura relativamente benigna representa um local atrativo para a construção de instalações projetadas para uso de longo prazo”.
Claro, nem tudo são flores. Uma localização dessas, perto dos pólos, não necessariamente ofereceria uma linha reta para a manutenção de comunicação direta com a Terra, essa foi a razão pela qual a NASA evitou enviar missões tripuladas ao lado afastado da Lua. Bussey reconhece o problema, mas também diz que não seria tão complicado resolver, com um aumento no orçamento. “Por conta da libração lunar, esses lugares provavelmente não oferecem uma visão constante da Terra”, diz. Libração é o nome que se dá ao “balanço” periódico do satélite, que permite que até 59% da superfície lunar fique visível da Terra durante um mês. “Entretanto, um simples satélite de comunicação em órbita lunar corrige o problema”, continua.
Imagens da superfície lunar
As imagens da Clementine foram tomadas durante o verão do hemisfério Norte lunar, ao longo de 71 dias terrestres. Como o eixo de rotação da Lua tem uma inclinação de 1,5 com relação ao Sol, é impossível, com base nelas, ter certeza de que os locais apontados por Bussey e seus colegas seguem iluminados também durante o inverno. Mas, se houver algum lugar em que isso acontece na Lua, será lá. E as confirmações estão a caminho, com as novas sondas projetadas para a exploração lunar nos próximos anos. ”A SMART-1, da Agência Espacial Européia, já em órbita ao redor da Lua, irá fornecer mais informações, mas provavelmente não fornecerá todas as respostas à questão da iluminação polar”, diz Bussey. “Ela tem uma boa câmera de alta resolução que fará imagens bem detalhadas da superfície, mas não imagens regionais do pólo Sul. A missão indiana Chandrayaan-1, em 2007 e o Lunar Reconnaissance Orbiter, da Nasa, devem fornecer dados mais extensos”.
Bussey está muito animado com o renovado interesse pela Lua. “Esta é uma época muito empolgante para a exploração lunar, com muitas missões internacionais e a real possibilidade de pessoas voltando lá para ficar”, afirma, reiterando total apoio ao projeto do presidente dos EUA, George W. Bush, de retomar a exploração tripulada além da órbita terrestre, com missões à Lua como forma de preparação para missões futuras de exploração conduzidas por astronautas no planeta Marte.
O entusiasmo é tanto que ele nem faz questão de que o local identificado por ele para a construção de uma futura base seja o escolhido. “Eu acho que vai ser sensacional ter astronautas de volta na Lua, em qualquer parte dela! No entanto, os pólos são interessantes porque permitirão que os astronautas fiquem próximos de possíveis depósitos de gelo, que representam um grande recurso”, diz.
Em busca de gelo
Gelo na Lua é extremamente raro, porque uma vez que a luz do Sol o atinge, ele imediatamente sublima e evapora para o espaço. O único lugar em que ele ficaria preservado é no fundo de crateras profundas, em que a luz nunca chega a iluminar. Curiosamente, o pólo Norte lunar oferece as duas condições, escuridão e iluminação perpétua, muito próximas uma da outra. Sem dúvida, um prato cheio. Acontece que naves espaciais não são movidas pela vontade dos cientistas, e sim por investimentos governamentais pesados. Estaria o governo americano pronto para investir nisso? Bussey pensa que sim.
“Estou muito otimista de que a Nasa irá levar pessoas à Lua por volta de 2020, possivelmente até antes”, diz o pesquisador. O discurso está afinado com o recém-nomeado novo administrador da NASA, Michael Griffin. Em seu discurso ao Senado americano, na semana passada, ele não só anunciou que deve reconsiderar a possibilidade de enviar uma missão tripulada para salvar o Telescópio Espacial Hubble como também disse que pretende acelerar o desenvolvimento do CEV [Sigla para Veículo de Exploração de Tripulação], nave sucessora do ônibus espacial que deverá conduzir as missões lunares sugeridas pelo plano de Bush.
Em poucas palavras, se tudo correr conforme o plano de Bussey e outros cientistas que apóiam o retorno à Lua, muitos meninos e meninas hoje podem arriscar abandonar os sonhos de virarem jogadores de futebol e atrizes, em favor de tentar a vida explorando o cosmos.