Muito pouco tem sido falado até hoje com relação às expectativas sociais que envolvem a categoria do extraterrestre. Isto significa que não dispomos de bibliografia específica em ciências humanas. Podemos, entretanto, apontar no âmbito da Antropologia, por exemplo, os estudos voltados para a temática indivíduo/sociedade como contribuições significativas para uma reflexão neste sentido.
Todos os grupos humanos utilizam-se de símbolos para representar suas experiências. Por mais absurdas que estas representações possam parecer, elas estão baseadas na concepção ou na percepção de indivíduos organizados de alguma maneira. Os símbolos e signos são instrumentos de comunicação e permitem a formulação de um entendimento comum entre pessoas e grupos. O corpo extraterrestre, tal como é percebido, faz parte deste conjunto de instrumentos que refletem tais expectativas e pode ser objeto de estudo para uma Antropologia do Corpo.
O estudo das técnicas corporais representa avanço teórico significativo para esse tipo de Antropologia, constituindo-se instrumento imprescindível para a compreensão das relações indivíduo/sociedade. O corpo se molda a partir das relações com o meio e guarda em si os efeitos das práticas desse meio. Pode-se dizer que ele é o testemunho mais próximo do espírito humano. Através dele se sente, se percebe e se age no mundo. Baseado nisso é que tentaremos refletir com o propósito de conhecer um pouco mais a nós mesmos e quiçá, de conhecermos outro ser situado numa esfera até então intangível pelo racionalismo científico.
Outro extraterrestre, originariamente presente em narrativas de contato, motivando o que se configura hoje como um movimento social em torno da problemática ufológica, que traga consigo, na medida em que for se construindo, elementos conceituais e simbólicos que não estão dissociados da experiência dos indivíduos que o compõe. Só se percebe também a origem destes elementos e a sua transformação na medida em que se dá a mudança concreta no plano coletivo.
Esse outro extraterrestre é representado através da descrição do seu corpo. A esta descrição acompanham outros elementos que dão sentido às narrativas de contato e abduções – seqüestro de humanos terrestres por alienígenas. Estes elementos, aliados às hipóteses básicas abaixo mencionadas, permite-nos perceber elevado grau de expectativa, representando em nossa sociedade uma \’situação de contato\’, para usarmos um conceito antropológico. As suposições básicas não se constroem em separado das concepções correntes.
É perceptível no pensamento social ocidental a influência, por exemplo, de idéias darwinistas relativas à origem e evolução natural da vida na Terra, mescladas a concepções religiosas diversas. Para o senso comum, estas idéias se confundem com a de um paraíso no qual foi criado o homem em sua forma perfeita, como obra divina. A necessidade de conciliação entre as idéias ou concepções de evolução natural e de criação divina faz com que uma grande parcela da sociedade admita a possibilidade de uma intervenção permanente de um elemento transcendental. Nesse caso, o criador acompanha a criação que está então submetida a determinadas leis naturais que estabelecem limites e solicitam a intervenção do Criador.
A mesclagem destas idéias mais as concepções próprias do movimento ufológico, aliadas ao desenvolvimento tecnológico da sociedade contemporânea, permitem a consolidação de novas concepçõese formas de pensar do homem em sociedade. Ou seja, a problemática dos discos voadores hoje, em nossa sociedade, reflete expectativas sociais diretamente vinculadas a formas de percepção da evolução e do futuro da Humanidade.
Nas narrativas de contato com seres extraterrestres encontram-se mais especificamente tais expectativas representando valores e tendências da atualidade. As formas físicas destes visitantes em contato são expressas através de desenhos ou retratos falados. Os desenhos são uma forma de ilustração das narrativas e constituem a representação gráfica mais aproximada da experiência desses agentes sociais. A base de apoio dessa expectativa ou a sua motivação em relação ao nosso futuro evolutivo não se limita à problemática ufológica, mas toma com esta novo impulso, ou seja, com a informação de que estamos quotidianamente – em localidades mais diversas da Terra – em contato físico com seres de outras origens, com outro extraterrestre.
Nessa relação de contato com alienígenas, o fato de sermos visitados (e não de sermos nós os visitantes) nos remete para uma condição de inferioridade e afirmação de uma identidade um tanto negativa frente às civilizações que exploram nosso mundo
A expectativa social a que nos referimos se expressa na leitura do corpo dos seres em contato, através do físico do alienígena retratado em desenhos. Estas leituras (dos personagens das narrativas) e o lugar social que ocupam em relação a nós, motivam-nos (leitores) no sentido de tê-los como reflexo de nós mesmos no futuro. Trata-se de uma expectativa em relação ao futuro da Humanidade terrestre numa perspectiva de evolução, não apenas biológica e tecnológica, mas também sociológica e exossociológica. Esta expectativa nos coloca diante de alterações significativas das relações hoje estabelecidas. Ou seja, em função dos novos referenciais aumenta o grau de ansiedade coletiva, sendo já perceptível certa mudança de hábitos, comportamentos e concepções.
Duas hipóteses representativas de novas concepções se fazem presentes no meio ufológico, quando das interpretações de narrativas de contato com povos do espaço. Com elas, pretende-se explicar as motivações básicas destes seres em manter um acompanhamento permanente da sociedade humana terrestre, da forma como é apresentado através das narrativas. Uma relação de contato com variação entre um comportamento amável e paternal até um comportamento arredio, furtivo e muitas vezes agressivo. Acredita-se numa perspectiva: que a presença e ação dos seres extraterrestres em nosso planeta tem por objetivo contribuir para o aprimoramento e desenvolvimento biológico e espiritual da raça humana terrestre. Por outro lado, essas ações têm como meta o uso dos corpos terráqueos e seus elementos de formação orgânica para a restauração genética dos seres contatantes.
O valor predominantemente norteador para as expectativas contidas nas hipóteses mencionadas está presente no fato de lhes ser imputado o caráter intelige
nte e de um estágio de evolução superior ao nosso, além de desejado por nós. Embora se perceba que essa concepção de evolução esteja hoje basicamente associada ao desenvolvimento técnico-científico, muitos são aqueles que a concebem como um processo incondicional de retorno à natureza – que prima pela evolução do espírito e tem como condição a purificação do corpo. Esse desejo de retorno à natureza reflete também a insegurança humana frente ao curso de seu desenvolvimento técnico. Ou seja, o roteiro atual de evolução da civilização humana é entendido como um impedimento para a consolidação de novos valores éticos e morais. Parecem dizer esses grupos humanos que primam pelo crescimento espiritual em detrimento de qualquer desenvolvimento tecnológico.
Nossas técnicas corporais – A tipologia de seres extraterrestres é extremamente diversificada. Cada um dos contatados clássicos da Ufologia apresenta uma legião de tipos de ETs diferentes. As ilustrações também são feitas por desenhistas diversos. Pode acontecer que sejam esses profissionais os próprios contatados ou, de outra forma, que estes se tornem narradores de suas próprias experiências para especialistas em desenho artístico.
As diferenças são consideráveis, assim como as características comuns. Por isso os estudiosos procuram fazer uma classificação tipológica. Se lembrarmos de nossa história, somos levados a perguntar se temos capacidade de nos relacionar pacificamente com tantas diferenças de forma, origem e nível evolutivo. Que disposição social se configurariam a partir de tais relações? Uma leitura dos corpos destes seres, inspirando-se no estudo de Mary Douglas (Símbolos Naturales, 1978), leva-nos a uma concepção de sociedades altamente formais. Além dessa idéia, pode representar a nossa expectativa em relação ao futuro. De tal forma, imaginamos nossas relações sociais em um novo contexto.
Grande parte dos corpos de extraterrestres expressam um alto grau de controle das funções físicas pela ausência ou redução das cavidades nariz, boca, olhos, orelhas, ânus e genitália. Com tais características, funções de ingestão e excreção têm que ser rigidamente controladas. Para Mary Douglas “… em síntese, as aberturas do corpo dependerão da preocupação com as saídas e entradas sociais, as rotas de escape e invasão. Onde não existe uma obrigação em preservar os limites da sociedade, tão pouco surgirá a intenção em se preocupar em manter os limites corporais. A relação dos pés com a cabeça, do cérebro com os órgãos sexuais, da boca com o ânus, expressam os esquemas básicos da hierarquia. Em conseqüência das hipóteses de que o controle corporal constitui uma expressão da segurança social é que o abandono desse controle do corpo, neste ritual, responde às exigências da experiência social que se expressa.”
Nessa relação de contato, o fato de sermos visitados e não visitantes, nos remete para uma condição de inferioridade e afirmação de uma \’identidade negativa\’ frente a outro ser que ocupa uma posição superior e não marginal numa nova concepção da hierarquia social. A sociabilidade desse ser é construída por oposição à condição que assumimos na relação. O extraterrestre é sempre um superdotado em relação a nós. Se às vezes encontramos um caso que foge à regra, haverá algum atributo ou qualificação de caráter compensatório que o eleva novamente à condição superior.
Universalizamos nossos valores representando-os em nossa forma de percepção dos extraterrestres. Por exemplo, aprendemos que a sede da inteligência no corpo humano é o cérebro. Ao representarmos na forma de desenhos dois indivíduos com níveis de inteligência diferentes, o modo mais indicativo será diferenciá-los pelo tamanho da cabeça. Aquele que possuir maior inteligência será representado com volume craniano maior. Por outro lado, os tipos com cabeça grande têm sido mais divulgados. Será mesmo porque existem um maior número de contatos com este tipo? Não estarão presentes nas narrativas porque nos agradam mais e por serem representantes de nossa expectativa os tipos com cabeça grande? Estariam eles, assim, mais adaptados à condição que estamos construindo para uma relação de contato com os seres extraterrestres?
Desejamos que esse ser alienígena seja alguém superior a nós e inteligente o bastante para dar solução a problemas que fogem do nosso controle. O nosso desejo ou expectativa de que sejam superiores pode possuir um fundo psicológico e estar relacionado à constatação histórica de nossa incapacidade ética e moral de lidar com sociedades em estágio considerado por nós como inferiores. Nesse sentido, temos medo de sermos menores em um contato entre civilizações interplanetárias. Em tal relação, vivemos uma situação ambígua: dominamos ou seremos dominados. Pelo medo de sermos dominados apelamos para princípios éticos que norteiem a comunicação e nos vemos obrigados a descobrir formas de agir eticamente, pelo menos por reciprocidade de intenções. Seremos capazes disso?
Quanto aos órgãos da visão, os olhos grandes podem representar uma expectativa de maior capacidade de visualizar e conhecer. Ver é condição para conhecer. Pode ser que aceitemos o ser de cabeça e olhos grandes como um tipo que melhor representa o nosso desejo de conhecer. Estes seres reúnem os atributos desejados e considerados necessários para a nossa busca pelo espaço. Ter inteligência e capacidade de visualização para, enfim, definir estratégias de defesa ou obter respostas urgentes frente a situações desconhecidas. Mas quem terá esse potencial? Nós ou eles? E por que os tipos mais conhecidos possuem boca e nariz pequenos em relação aos nossos? Será porque de fato não dependem tanto destes órgãos para atividades de ingestão e excreção? Ou por que queremos representar nossos valores, considerando tais atividades como menores ou impuras, portanto, incompatíveis com uma condição de seres espaciais? Assim também são ânus e órgãos genitais que sequer são mencionados na maioria das narrativas de contato. E condição para se viver no espaço uma alteração das funções de reprodução, ingestão e excreção?
Muito raramente há a diferenciação de sexos, que na maioria das vezes se apresentam como assexuados. Quando se observa essa distinção, não se tem elementos suficientes que permitam afirmar diferenças de comportamento, h&aac
ute;bitos ou mesmo uma divisão de trabalho. Funções de reprodução para indivíduos do sexo feminino foram observadas, “…seguindo a trilha de Villas Boas (MG), os contatados brasileiros José Inácio Álvaro, João Valério Reis e Antonio Carlos Ferreira, também copularam com extraterrestres do sexo feminino”. Em casos de abdução, na maioria das vezes essa é uma função laboratorial com a participação da mulher no processo. Por outro lado, a maior parte das narrativas mostra sempre uma figura com traços masculinos no comando de operações práticas.
A identificação por sexo se faz pela aparência exterior ou por identificação da própria entidade em contato. O corpo nu raramente é visto. O uso dos genitais como sinais de reconhecimento fica comprometido. A roupagem uniforme impede, na maioria dos casos, a visualização de diferenças morfológicas. Em um grupo de alienígenas isso faz com que todos sejam identificados como sendo do sexo feminino ou do masculino. O trabalho é visto como prazeroso e constante, sem o envolvimento com ciclos temporais e sem condicionamento das ações associado ao controle do tempo, com vistas a atender a um regime de produção e consumo. O processo de interação descrito nestas narrativas é muitas vezes insuficiente para dar conta com profundidade de aspectos específicos do comportamento, hábitos, costumes de âmbito doméstico ou privado. Apesar disso, há um alto grau de detalhamento descritivo do ambiente circundante, feito pelo contatado, e das sensações e emoções sentidas por ele.
Controle e dominação – Pode-se perceber sinais de instruções diferentes. Há casos em que se tem a impressão de tratar-se de uma única sociedade assexuada e em outras, de uma composta por homens e mulheres, tal como a nossa. Na maioria das narrativas observadas, figuras com características femininas estão ausentes. Nestes casos, o grupo de mulheres terá papéis predominantemente restritos ao âmbito, digamos, doméstico, com ações exclusivamente planetárias? Ou ainda, o dos homens terá mantido sob controle e dominação as mulheres? E considerando as narrativas onde o homem não aparece, terão ali desenvolvido experiências opostas às sugeridas, no que diz respeito aos papéis do macho e da fêmea? Terá a sociedade de homens papéis circunscritos ao espaço doméstico planetário? Estarão eles dominados pela sociedade de mulheres? Ou elas terão se sobressaído como uma classe exploradora e/ou dominadora na conquista do espaço? Ou ainda, nestas sociedades não existem as diferenciações de gênero que fazemos ou queremos fazer? Encontraremos respostas para estas questões numa situação de contato mais aproximado no futuro? Serão os nossos comportamentos, hábitos e costumes, confirmados ou considerados atrasados? Teremos que rever novamente conceitos como primitivo e civilizado? Ou nos sujeitaremos a outros conceitos e práticas que classifiquem e hierarquizem os indivíduos e as sociedades?
Todas estas perguntas não deixam de refletir muita insegurança e incerteza com relação à definição de nossos papéis sociais e ao nosso próprio comportamento frente ao futuro. E quantas perguntas mais poderemos fazer? Serão universais e estáveis os nossos valores e procedimentos atuais? Com a velocidade permeando todos os acontecimentos, seremos capazes de evitar a fragmentação completa? Que tipo de sociedade construiremos para as gerações futuras? E tantas outras perguntas mais!
A presença de crianças tem sido narrada em casos de abdução. Elas são apresentadas como produtos de experiências genéticas e mostradas como seres híbridos entre as raças visitantes e os humanos. Não se observa na retratação dos ambientes visitados a diversidade de fauna e flora. Quando isso acontece são descritos pelos contatados com grande dificuldade. Utiliza-se sempre a comparação com elementos conhecidos precedidos de “parece com …” ou “lembra …” etc. A variável tecnologia está sempre presente, onde se vê teclados e painéis eletrônicos, instrumentos de laboratórios e monitores de imagem. Por outro lado, a decoração dos ambientes é mínima, e quando existe, os móveis são simples e estão mais adaptados à utilidade que à estética.
Observa-se também uma grande uniformidade do corpo nas sociedades interplanetárias cuja origem seja comum e por outro lado grande diversidade de formas corporais, caracterizadas como raças ou sociedades com origens diferentes. Quando se encontram juntos estes tipos distintos se apresentam como membros de conselhos ou organizações cooperadas em atividades de interesse comum de nível interplanetário ou mesmo intergaláctico.
Um grande número de visitantes possui aspectos comparados a animais. Estes tipos animalescos apresentam muitas vezes destreza e agressividade superior aos que se aproximam da aparência humana. Seres robóticos possuem pouca mobilidade física, sendo seus movimentos compensados pelo uso de recursos tecnológicos.É difícil perceber aspectos que demonstrem alguma atitude que se possa comparar mais objetivamente com as ações humanas no cotidiano. Entretanto, todos possuem movimentos bem coordenados aos seus objetivos, incluindo grande capacidade de fuga e despistamento de seus observadores, independente de se ter grande mobilidade física.
O uso de técnicas corporais pode levar um condicionamento físico e adaptação do corpo a uma forma específica e relativamente uniforme para uma determinada população. Se é assim, a uniformidade física dos grupos de visitantes descritos pelos contatados pressupõe a existência de uma consistência técnica, de um treinamento e educação disciplinados e de alta precisão de uma sociedade com elevado grau de organização formal. Além disso, tal uniformidade e formalidades lembra-nos organizações militares hierarquizadas e com suas ações e movimentos coordenados a objetivos específicos.
E se Virchov considerava o homem de Neandertal um \’desgraçado degenerado\’ por possuir os membros infe
riores arqueados, que diria ele se pudesse observar tipos como o ET de Varginha (MG) ou caso Hopkinsville em Kentucky (EUA), ou o de Caracas (Venezuela) e tantas outras formas tão ou mais bizarras? Estes três tipos, cuja forma física aproxima-se de certos animais, apresentam-se nus – com total ausência de elementos de tecnologia visíveis no próprio corpo que possam representar símbolos culturais -, o que pode sugerir interpretações de que conservaram nesse aspecto uma proximidade com um provável estado de natureza. Ainda assim, tais tipos são considerados seres superiores, uma classificação geral determinada pela sua origem espacial e não pela racial.
Elementos mágicos – Por outro lado, existem o que podemos chamar de elementos mágicos – instrumentos auxiliares na ação dos extraterrestres no meio ambiente terrestre. Estes mecanismos são encontrados na maior parte das narrativas, e no mínimo têm relação aparente na forma e na utilidade com aquilo que entendemos como tecnologia ou elementos da cultura. Cabe ainda algumas perguntas. Acredita-se que no caminho da evolução natural, elementos da cultura propiciaram ao corpo humano transformações refinadas, tornando-o mais adaptado. Esse refino e adaptação são entendidos como sinônimos de evolução. Entretanto, considerando tipos como os antes citados, até que ponto as tecnologias como elementos do meio social e cultural propiciam mudanças físicas como sinônimo de evolução? Nossos corpos, físico e social, podem ser considerados referenciais suficientes para medir o nível de evolução na relação com povos do espaço? Quem são e que natureza possuem estes novos seres que surgem no horizonte das experiências humanas?
Um detalhe interessante do episódio ocorrido em Varginha é que são raros os casos em que os visitantes são retratados em nosso meio acocorados ou mesmo sentados. Nesse caso, aparentemente acuado, ele se apresenta de cócoras em meio à vegetação. Virchov, quando se refere ao homem de Neandertal, sugere que o arqueamento de seus membros seja devido ao hábito de se manter nessa posição. Nem todos os tipos alienígenas possuem tal flexibilidade corporal. Estaria esta habilidade nos movimentos relacionada à igualdade de condições para uma adaptação e, portanto, para um rumo e ritmo de evolução semelhante ao nosso?É o que parece haver pelo menos em termos de expectativa social: uma associação da rigidez ou da flexibilidade corporal e comportamentalem um nível inferior ou superior de evolução e capacidade de adaptação necessária das partes numa situação de contato.
Afinal, a concepção é de que estes seres sejam provenientes do espaço, o que constitui um reforço à idéia de que sejam superiores, não só por representar parte de uma realidade inconcebível na sua totalidade pelos humanos terrestres, mas também por terem tido eles, nesse caso, a habilidade de chegar a nós e não nós a eles. O que teremos nessa relação que possa contribuir positivamente para a afirmação de nossa identidade? Ou teremos inevitavelmente uma conclusão negativa dessa mesma identidade? Uma série de narrativas ilustradas tem mostrado tipos que vão além do exótico: ausência ou redução da dimensão de cavidades como nariz, boca, orelhas, olhos; caixa craniana desproporcionalmente grande em relação ao corpo; apenas um olho, etc. Muitos deles apresentando símbolos culturais relacionados a alguma espécie de tecnologia, como uso de capacetes e vestimentas metálicas, instrumentos auxiliares em sua ação no meio ambiente como utensílios de ataque e defesa etc., de tal forma que se torna difícil fazer generalizações nesse sentido para formas mais comuns. Há uma mistura de tipos e características onde as exceções parecem suplantar as regras.
Percepção da realidade – Com relação às duas hipóteses mencionadas no início deste trabalho, elas refletem expectativas gerais e abrangentes. Nelas está explícito um par de oposições características de nossos modelos de percepção da realidade – o bem e o mal. Tal oposição nos chama atenção por representar uma permanência da estrutura básica dos modelos e ao mesmo tempo estar associada a um apelo para uma mudança social. A necessidade de ética nas relações, tanto entre nós quanto numa situação de contato, expressa a fragilidade do corpo frente ao perigo, na iminência de um salto para o desconhecido. A natureza não dá saltos. Entretanto, vivemos a impaciência adolescente frente ao futuro, aos riscos da natureza não dominada e o espaço cósmico. Será o universo extraterrestre uma arena onde se digladiam também os deuses? De qualquer forma, a expectativa social de que falamos representa a necessidade do conhecimento de novas regras no jogo da vida. Conforme a tese de Mary Douglas “…o controle corporal constitui uma expressão do controle social…”, nossas expectativas em relação ao corpo extraterrestre podem apontar para um nível cada vez mais alto de formalização das relações e práticas sociais.É o que também refletem as hipóteses mencionadas anteriormente.
A primeira suposição, a de uma utilização da Humanidade terrestre para a restauração genética de corpos e raças – e nesse caso se fala mesmo de raças -, de um modo geral, surge a partir da leitura do contatado num determinado contexto. Contribuem nesse sentido as diferenças na aparência e comportamento, muitas vezes nada saudáveis dos personagens que tomam parte em sua vivência. A não existência de uma estética em conformidade com nossos padrões sociais, a ausência de órgãos genitais e de figuras do sexo feminino. Enfim, a exclusão de emoção e erotismo etc., também nos induz a pensar que seres com tais características podem ter perdido o rumo natural e talvez ideal de evolução.
Representamos situações que sem dúvida expressam o desespero humano em relação ao futuro. De qualquer forma, para os valores predominantes em nossa sociedade, tal hipótese, cuja construção é motivada em decorrência do fenômeno das abduções, traz consigo a expressão clara de manipulação autoritária, de violação de direitos, de dominação do outro. O que poderia justificar tal comportamento? Estamos então frente ao nosso medo coletivo? Essas narrativas que determinam a primeira hip&
oacute;tese trazem em si, nesse caso, a expressão social do pavor que temos de sermos contatados por outras civilizações? Ou expressam o medo de nós mesmos quando nossas formas de organização, caracterizadas por um alto grau de formalização e controle social, podem redundar na eliminação destes símbolos, atributos ou características para nós naturais?
A segunda suposição, a de que estamos tendo um acompanhamento evolutivo permanente para um aprimoramento de nossos próprios corpos e espírito, também comunica expectativas que são o reflexo de uma ordem social. Isso nos faz pensar que todos os nossos símbolos naturais, bem como nossos valores, padrões de beleza, conduta, etc., devam sofrer muitas transformações num sentido evolutivo. E estas mudanças nos tornarão semelhantes aos nossos tutores com um alto nível tecnológico e espiritual – à imagem e semelhança do criador. Mas quem será, dentre tantos tipos, o nosso criador? São tantos quanto as narrativas existentes. Há semelhanças com a nossa morfologia, mas há também muitas diferenças. Se fôssemos nós os contatantes e tivéssemos a habilidade de adaptar nossa forma física não seria uma estratégia mais eficaz ser igual que ser diferente? Em tempos de \’hibridização\’ e clonagem será esta uma explicação para o adiamento do contato, a necessidade de se trabalhar uma forma física mais eficiente e adaptada à situação de contato que se constrói?
Ora! Seres extraterrestres devem ser necessariamente diferentes de nós, pensar de outra forma seria perpetuar idéias antropocêntricas. Essa suposição, no entanto, só reforça a necessidade de formas físicas adaptáveis à expectativa da sociedade contatada, seja em favor da semelhança ou da diferença.É interessante mencionar que em certos casos, nas ilustrações dos seres visitantes, são incorporados traços físicos de seus contatados. Sinais ou marcas que querem mostrar a relação de parentesco cósmico? Ou os contatados teriam sido escolhidos devido a alguma semelhança na aparência? Ou o desejo de um parentesco cósmico leva os contatados a incorporar nos desenhos traços comuns?
De acordo com Mary Douglas “… o corpo físico pode temer um significado social somente enquanto responde ao sistema. No que simboliza um ponto de vista natural é a relação das partes de um organismo como um todo. Os símbolos naturais são capazes de expressar a relação que existe entre um indivíduo e a sociedade nesse sistemático nível generalizado. Os corpos são você e a sociedade; algumas vezes estão tão próximos que quase chegam afundir-se e, noutras, muito distantes um do outro. A tensão que existe entre eles é que nos permite deduzir certos significados”.
Conhecer em profundidade outra sociedade implica em viver com ela, compartilhar valores, hábitos e costumes, privados e públicos. Consiste em conhecer os dois corpos, o indivíduo e a sociedade. Senão, como pensar no processo de aproximação de duas civilizações sem considerar as semelhanças e diferenças entre elas? Impossível.
Hibridização – E se estivermos sendo observados pari-passo, de tal forma induzidos ao desenvolvimento de conceitos científicos novos com o propósito de dar conta de problemas futuros numa situação de contato? O conceito de hibridização nos faz pensar nessa possibilidade entre humanos. E as narrativas de contato e abduções dizem que essa técnica é utilizada por grupos visitantes para diminuir as diferenças entre as formas físicas das civilizações, quando estas representam dificuldades no processo de relação. Trata-se, convenhamos, de um processo passível de ser pensado como estratégia de contato por parte de sociedades contatantes que detenham o domínio de tais técnicas. Fiquemos por aqui. Afinal, por ora, tais narrativas não representam, comparativamente, mais do que representou os contos de viajantes e sertanistas no período histórico das conquistas. Elas podem por sua vez representar frentes de atração da parte visitante para posteriores contatos interplanetários.