Em um dos debates da UFO Online – a lista de discussões da Revista UFO na Internet – surgiu uma grande polêmica entre os participantes a respeito do interesse ou não de nossos visitantes extraterrestres em manter um contato definitivo conosco, formal e oficial. Apesar de ser uma pergunta freqüente no meio ufológico há muitos anos, tal interrogação está longe de ser banal, pois mesmo com as várias hipóteses levantadas sobre os objetivos dos alienígenas, somente saberemos seu verdadeiro interesse quando interagirem com os homens da Terra. Dentre as mais variadas opiniões que esquentaram as discussões na lista destaca-se, pelo grau de incidência, a que afirma serem os alienígenas mais evoluídos que nós – não apenas científica e tecnologicamente, mas também moral e espiritualmente. Sendo assim, não compreenderiam como, apesar de termos alcançado razoável domínio sobre a natureza, ainda não somos capazes de erradicar males terrestres como a fome, a miséria, as injustiças sociais, as guerras, os desequilíbrios ecológicos, etc. Segundo esta ótica, caso os aliens se aproximassem de nós para ensinar a tecnologia das viagens espaciais, por exemplo, as conseqüências seriam desastrosas, pois o homem levaria sua poluição, suas guerras e a miséria planetária aos quatro cantos do Universo.
Numa linha de raciocínio oposta, há os que declaram que os ETs são seres malévolos e estariam apenas interessados em escravizar nossa população – ou até mesmo nos usar como fonte de alimento, julgando que haja escassez no planeta de onde vieram. Dessa forma, não teriam razões em nos contatar oficialmente, agindo completamente à nossa revelia. Se não fosse com estas intenções, os extraterrestres teriam contatado nossos governos e aterrissado no centro de grandes metrópoles, onde os meios de comunicação de massa pudessem registrar o fato.
Pouso em Praça pública — Os que assim pensam gostariam de ver uma frota alienígena pousando em frente da Organização das Nações Unidas (ONU). Argumentam que aliens verdadeiramente interessados em nos contatar não perderiam tempo assombrando rurícolas. De qualquer maneira, como estamos supostamente sendo visitados por inúmeras raças, tal pluralidade admite a existência de ETs bondosos ou malévolos. De acordo com o que tenho analisado dentro da Ufologia, essas duas posições incorrem no erro de julgar os ETs essencialmente como os humanos. Em uma analogia podemos lembrar de quando os europeus chegaram às terras que chamaram de América, encontrando aqui povos estranhos a eles, mas com os quais puderam interagir por serem todos igualmente humanos. Era razoável presumir, por exemplo, que os povos nativos teriam líderes com quem negociar, interesses em trocas comerciais, alianças e disputas a serem exploradas, crenças a serem substituídas pela religião cristã, etc, como puderam os europeus constatar.
Em suma, os homens encontrados naquelas terras, por mais que fossem aparentemente diferentes na cor da pele ou nas vestes, possuíam natureza e comportamento que difeririam dos exploradores apenas na forma, mas não na essência de suas origens. Entretanto, no caso das espécies alienígenas, essa familiaridade não pode ser assumida por uma razão muito simples: eles não são humanos! Conseqüentemente, quaisquer traços semelhantes aos nossos será mera coincidência. Sendo assim, não podemos julgá-los com os mesmos conceitos morais vindos de um princípio de bem e mal, amor e ódio.
Também é precipitado afirmar que nossos visitantes sejam espiritualmente mais evoluídos, já que podem não ter a faculdade mental que nós convencionamos chamar de fé. Por isso, espíritos, anjos, demônios, deuses e coisas do gênero podem ser conceitos incompreensíveis para eles. Podem não ter uma organização política e social como nós a concebe-mos, daí ignorarem nossas instituições governamentais. Tampouco podemos presumir que possuam modos de produção econômica que necessitem de interação comercial. E ainda, não podemos assumir sua afinidade com o meio-ambiente, pois nem sequer conhecemos o local em que vivem, se exploram uns aos outros, se guerreiam uns com os outros, se destroem ecossistemas como nós fazemos. Ou se vivem em uma harmonia paradisíaca, como nós sonhamos viver…
Reciprocamente, os ETs que nos visitam tão intensamente podem ter instituições, manifestações sociais e concepções de mundo que nem em nossos mais ousados delírios de ficção científica seríamos capazes de conceber! Claro que, para tal, devem necessariamente possuir um sistema social organizado. Mas como seriam manifestações sociais bem distintas das humanas, teríamos que expandir nosso próprio conceito de cultura para poder abarcá-las. Não poderíamos sequer nos apoiar nas ciências sociais para entender a questão, como a Antropologia, a Sociologia, as Ciências Políticas. Pois não é à toa que estas disciplinas são chamadas de humanas, que têm como objeto de estudo o homem em suas diversas manifestações sociais – e não alienígenas inumanos! Como vemos, nossa Ciência, nossa Filosofia e nossa visão de mundo ainda são essencialmente antropocêntricas…
Contato Oficial — Nesse sentido, nós de fato não estamos preparados para um contato oficial com civilizações alienígenas. Mas não há outra forma de nos livrarmos de nosso antropocentrismo senão contatando espécies inteligentes inumanas! E é justamente isso que um contato como o pretendido teria de mais traumático. Ao destruir nossas concepções antropocêntricas de mundo teríamos uma revolução intelectual em nosso planeta comparável ao heliocentrismo ou ao darwinismo. É o tipo de coisa para a qual as pessoas nunca estarão preparadas! Mas com a qual, eventualmente, podem ter que se deparar a qualquer instante. Por outro lado, nossos visitantes alienígenas, amigos ou não, tampouco estariam preparados para o mesmo choque, já que nossas manifestações sociais seriam igualmente estranhas para eles.
Um contato formal e oficial entre terrestres e extraterrestres, por ser recíproco, certamente exigiria de ambas as espécies formas de interação até então inéditas para elas. É razoável, portanto, que, uma vez tendo nos descoberto, nossos visitantes fiquem algum tempo estudando a Terra, para saber a melhor maneira de nos contatar. E por certo que a heterogeneidade dos grupos humanos não deve ajudar muito tais viajantes espaciais nessa tarefa. Ainda que correndo o risco de ser interpretado erroneamente como um defensor do argumento de que globalização deva nivelar por baixo a riquíssima diversidade cultural da Humanidade, acredito que, para uma civilização avançada, contatar o governo dos Estados Unidos deva ser bem diferente de contatar os yanomami na Amazônia…
Claro que todas as considerações tecidas até aqui só se aplicam caso os alienígenas realmente tenham algum interesse em fazer contato conosco! Em nossa petulância antropocêntrica, consideramo-nos uma obra-prima da natureza e estamos convencidos de que os aliens não teriam outro motivo para vir a este mundo que não seja nos contatar. Não nos passa pela cabeça que eles possam estar interessados em qualquer outra coisa que não sejam esses macacos bípedes presentes em cada canto deste planeta! Pode muito bem ser que eles considerem um contato oficial conosco algo tão absurdo quanto nós consideraríamos estabelecer uma embaixada humana entre um bando de chimpanzés no meio da Amazônia. Nós não reconhecemos nos macacos as faculdades mentais que os humanos possuem, que os permitem interagir uns com os outros segundo padrões complexos que nós chamamos de comércio, política, diplomacia, etc.
Da mesma forma, os alienígenas podem não reconhecer em nós as faculdades mentais que eles possuem, e que lhes permitiriam interagir uns com os outros de maneiras inimagináveis por nós – ainda que nossas realizações nos coloquem claramente num patamar intelectual acima dos demais animais (nós também reconhecemos os chimpanzés como os mais inteligentes dentre os animais ditos irracionais). Para uma raça alienígena, poderíamos não passar de atrações de um zoológico ou cobaias, se é que esta última opção não seja a razão principal das abduções. No entanto, acertará quem argumentar que os alienígenas, ao nos tratarem do mesmo jeito que tratamos os animais, estariam compartilhando do mesmo desdém humano, por formas de vida consideradas inferiores, que nós temos. Tal suposição mostra como é difícil nos livrarmos dos preconceitos antropocêntricos!
Seres Inumanos — Sobre esse ponto, argumentarão aqueles que se dizem contatados que os alienígenas não se mostram tão inumanos assim. Em suas mensagens dirigidas a seletos personagens da Ufologia Mundial, parecem possuir motivações muito parecidas com as humanas, só que depuradas por evolução espiritual, no caso das raças consideradas amigas, ou então corrompidas por estagnação moral, no caso das ditas inimigas. Alguns ufólogos chegaram a lançar hipóteses, baseadas nos relatos dos contatados, de que a Humanidade teria sido civilizada – ou até mesmo geneticamente criada – por raças alienígenas num passado longínquo. Dizem que aquilo que chamamos de manifestações culturais, morais e espirituais humanas seriam, na realidade, conceitos importados dos alienígenas criadores ou civilizadores, com evidentes adaptações no decorrer de nossa História. Sob tal ótica, não seria de se estranhar, portanto, que os alienígenas parecessem demasiadamente humanos segundo os contatados. Tais hipóteses, contudo, carecem de sustentação objetiva, ao passo que o princípio adotado pela Antropologia e a História, de que a Humanidade evoluiu por si mesma, sem nenhum empurrão de deuses ou alienígenas, se apóia em milhares de descobertas arqueológicas.
Claro que existem os monólitos gigantes espalhados pelo mundo, as linhas de Nazca, as pirâmides no Egito, as pinturas rupestres, os vimanas hindus e tantas outras coisas que não são muito bem explicadas por nossa Ciência. Mas temos que considerar que, quando se tenta reconstruir um passado distante, é de se esperar que algumas peças não se encaixem no quebra-cabeças evolutivo, pois tiveram seu significado corroído com o passar dos séculos. Contudo, enquanto a maioria dos elementos recuperados por essas ciências se enquadrarem na concepção de evolução cultural autônoma da Humanidade, abandonar tal idéia em favor da tese da ajuda cósmica seria trocar o pouco duvidoso pelo muito duvidoso, e não é assim que a Ciência progride.
Outro problema do fenômeno do contatismo é a interpretação eminentemente subjetiva a que estão sujeitas as mensagens recebidas. Os contatados, em geral autoproclamados, estão convictos de que se comunicam com alienígenas através de formas sutis. Mas tais contatos podem ser vistos diferentemente por pessoas de outras áreas. Por exemplo, um espírita pode dizer que sejam casos de mediunidade, que estas pessoas na verdade se comunicam com espíritos de luz (ou das trevas). Já os evangélicos dirão que são demônios se passando por extraterrestres para desviar as pessoas dos caminhos de Deus. Psicanalistas e psicólogos argumentarão que tais experiências não passam de alucinações, fantasias do subconsciente ou outras manifestações psíquicas, oriundas das próprias mentes dos envolvidos. Este autor pode ainda oferecer mais uma interpretação: a de que os contatados estariam projetando nos aliens suas próprias expectativas em relação ao futuro da Humanidade, já que um dia poderemos ser como eles. A dúvida que atormenta essas pessoas, que tentam dirimir seus alegados contatos, seria se a evolução moral e espiritual da civilização terrestre acompanhará seu desenvolvimento científico e tecnológico.
Após todas estas considerações, é razoável afirmar que ninguém, até hoje, foi capaz de apresentar provas materiais de que sua interpretação particular do fenômeno do contatismo é a única válida. Assim, o caráter subjetivo desqualifica o fenômeno como fonte de informações cientificamente válidas. A Ciência pede mais do que interpretações: pede provas que sejam incontestáveis. Por isso, nesta abordagem sobre um eventual contato entre humanos e extraterrestres, devemos ignorar os relatos dos supostos contatados. Mesmo que suas experiências possam ser legítimas manifestações do Fenômeno UFO, tal legitimidade não pode ser objetivamente verificada.
Em suma, tudo o que podemos com segurança assumir sobre os alienígenas que nos visitam é que, se evitam contato, o fazem segundo seus próprios interesses e conveniências – que podem ou não vir de encontro aos nossos. E se a problemática ufológica é de fato uma manifestação de seres extraterrestres em nosso meio, creio que a única maneira segura de desvendar suas intenções é investigar o dito fenômeno criteriosa e objetivamente, despindo-se de interpretações subjetivas inerentes ao contatismo e de pressuposições antropocêntricas t&iacu
te;picas das ciências humanas.