Não é verdade que a Área 51 seja tão secreta e que sua existência só tenha sido reconhecida publicamente depois de 1995. Pelo menos é o que garante Peter W. Merlin, pesquisador de história aeronáutica e profundo conhecedor das instalações militares ao redor do Lago Groom, sendo o responsável por um dos melhores mapas já divulgados sobre o interior e os arredores da base. De uma maneira geral, as pessoas acreditam que tudo o que acontece na Área 51 é secreto. Mas isso é claramente um mito, na acepção de Merlin: “Existem documentos que comprovam o reconhecimento público e oficial da existência de instalações militares no Lago Groom desde o início da sua construção. Entretanto, muito ironicamente, é exatamente o mito sobre o sigilo da Área 51 que mais tem colaborado para expor os seus segredos”. Essa é exatamente a razão pela qual a base tem atraído tanto a atenção popular. As pessoas adoram mistérios. E quanto menos você souber sobre a Área 51, mais ela pode ser utilizada como um espelho para a imaginação pública.
Christopher Beall, em um artigo de 1987 para o Las Vegas Review Journal, descreveu a Área 51 como “um lugar com uma história de rumores negros e muita especulação, e um nome que hoje em dia já se transformou até numa espécie de folclore”. Em uma entrevista que concedeu em 1997, Stuart Brown, editor da revista Popular Science, avaliou que “é como se fosse um quadro negro, no qual você pode projetar os seus sonhos e os seus medos”. A mídia tem sabido explorar esse mito, divulgando insistentemente que a Área 51 “não existe” nos registros oficiais, enquanto repórteres de jornais e televisão têm ignorado os fatos históricos em favor de rumores sensacionalistas. Aviões espiões hipersônicos e corpos de alienígenas atraem muito mais espectadores e vendem muito mais revistas do que mísseis Stealth e equipamentos de guerra eletrônica. Como disse um personagem do filme O Homem Que Matou o Facínora [The Man Who Shot Liberty Valence, dirigido em 1962 por John Ford], “quando a lenda for mais interessante do que a verdade, publique-se a lenda”.
Poder bélico — Da mesma maneira que um objeto voador não desconhecido serve como um meio de materializar todos os devaneios, medos e desejos ocultos, o segredo em torno da Área 51 serve para extravasar as apreensões coletivas de uma dominação bélica global. ETs dominadores e aeronaves superpoderosas são produtos da soma de dois componentes tão significativos quanto distintos: o desconhecido e o militar. O resultando é uma das mais extravagantes histórias de extraterrestres já vistas dentro da Ufologia. O que o grande público ignora ou simplesmente não se interessa em saber, é que a Área 51 nunca foi um grande segredo para os pesquisadores de aviões e para os militares em geral. Com exceção do período inicial da Guerra Fria, quando o U-2, o primeiro avião espião foi desenvolvido sob um clima de competição extrema com os russos, uma simples pergunta referente à origem de tais armas secretas poderia revelar muito sobre a Base Aérea de Nellis, 100 km ao sul, e seus arredores. E quando o U-2 se tornou oficialmente conhecido, não havia mais como manter segredo em torno da Área 51, já que ela é uma parte intrínseca de sua história.
Tecnologia extraterrestre — Destarte, se a Área 51 nunca foi tão sigilosa assim, por que até hoje não se sabe com certeza se não há discos voadores e extraterrestres por lá? Novamente, esses mesmos pesquisadores entram em cena para desmistificar tudo isso. Para eles, as especulações sobre o Lago Groom são como UFOs: começam como um pequeno ponto distante e brilhante no céu, e desembocam em um complô extraterrestre com pessoas inocentes sendo cozidas em um caldeirão. Sem dúvida, podemos identificar muitos fenômenos luminosos estranhos sobre o local, mas afirmar peremptoriamente que eles são discos voadores pilotados por seres que estabeleceram um acordo secreto com o Governo dos Estados Unidos, vai uma grande distância. E a razão é muito simples: não existem evidências suficientes para isso. Ao especular sobre algo, devemos sempre assumir que nossas conclusões também terão, inevitavelmente, um caráter especulativo. Ou seja, na prática, não representam nada. A não ser que encontremos provas reais que as sustentem. E no caso específico da base do Lago Groom, essas provas nunca apareceram. O que apareceu, e de maneira profusa e bem clara, é o resultado de anos e anos de testes e projetos secretos naquela região: três gerações de aviões espiões e muitos tipos de aviões experimentais em vias de entrarem em atividade. Os pesquisadores de aviões, empolgados e totalmente dedicados à indústria aeronáutica militar, têm acompanhado esse processo desde o final da Segunda Guerra Mundial. E eles nunca viram nada que sugerisse a presença alienígena ali. Ainda mais incoerente é essa história de “reengenharia de UFOs”, ou seja, a incorporação de tecnologia alienígena que se refletiria nos grandes avanços tecnológicos existentes hoje em dia. Pura balela! Quem conhece tecnologia sabe muito bem que esse suposto “salto” nunca existiu. A ciência avança sempre passo a passo, valendo-se dos aprendizados de um experimento para iniciar outro, de uma teoria para outra, em seqüência lógica e com perfeita solução de continuidade. Podemos ver isso no campo da eletrônica, da engenharia aeronáutica, das teorias da física e em qualquer lugar onde a ciência seja aplicada.
Muitos dos relatos mais agressivos poderiam ter sido implantados ou sugeridos à comunidade por agentes militares, visando confundir os pesquisadores e desviar a atenção do que realmente se passa por lá
Principalmente em tecnologia. Infelizmente, a maioria do público, incapaz de compreender os desenvolvimentos atuais do campo científico, prefere o caminho das soluções mágicas e da fantasia. Prefere ver o que quer, e não tentar estudar e entender o que se apresenta para nós. A pergunta, porém, persiste: será que não poderia existir algo oculto envolvendo os extraterrestres? Será que as teorias conspiratórias são somente uma invencionice de paranóicos de plantão? Mais uma vez, devemos tentar separar a fantasia da realidade se quisermos chegar a alguma conclusão sensata. Em primeiro lugar, poderíamos olhar somente para o fenômeno. Existem realmente UFOs sobre a Área 51? Caso afirmativo, passamos à segunda pergunta: existe alguma documenta&c
cedil;ão ou algum fato que nos permita associar os UFOs com uma suposta tecnologia extraterrestre? Com exceção do comportamento anômalo, e de muitas especulações que, como pudemos perceber também, carecem de fundamentos, não há maiores elementos que dêem suporte a essa hipótese. Não resta opção a não ser explorar outras possibilidades e ver se elas não fazem algum sentido. Comecemos pelos movimentos anômalos de luzes sobre a base. Tom Mahood, em seus artigos, explica-os como sendo experimentos com lasers, o que cientificamente é viável e elimina uma boa quantidade de avistamentos, mas não todos. Portanto, é uma idéia boa, mas que não resolve completamente o problema proposto. Outra boa possibilidade é a de que se tratariam de novos sistemas de propulsão e sustentação para aeronaves. Entretanto, no estágio atual do desenvolvimento tecnológico não há nada que faça com que bolas luminosas voem a velocidades absurdas sobre o chão do deserto. É uma possibilidade interessante, mas carece de maiores evidências a seu favor.
Atividades alienígenas — Pessoas poderiam estar sendo manipuladas psicologicamente de modo a que servissem para encobrir tecnologias muito recentes. Eis mais uma boa possibilidade. Muitos dos relatos mais agressivos poderiam ter sido implantados ou sugeridos à comunidade por agentes militares, visando confundir os pesquisadores e desviar a atenção do que realmente se passa por lá. Ou seja, ocultar o desenvolvimento de algumas tecnologias ainda inéditas na aeronáutica. Sob a fachada de atividades alienígenas, os pontinhos luminosos se transformariam em bólidos superpoderosos nas mentiras da contra-informação, e assim disfarçariam uma tecnologia ainda incipiente. Não há dúvidas de que isso realmente deve acontecer em determinados níveis. Mas contra essa hipótese ainda temos o fato de que muitas das testemunhas são pessoas confiáveis, abalizadas e reconhecidamente interessadas na realidade do fenômeno, como Chuck Clark, autor do The Área 51 and S-4 Guidebook [Guia da Área 51 e S-4, 2003. Veja mais nesta edição], por exemplo. Portanto, mais uma explicação parcial. Em uma variação da hipótese anterior, e apresentando uma idéia que começa a entrar em voga, poderíamos sugerir que a Área 51, na realidade, é somente um chamariz. E que as atividades conjuntas do Governo dos Estados Unidos com extraterrestres foram transferidas para uma área mais segura, deixando Lago Groom como uma espécie de Disneylândia para a Ufologia, visando ocultar as atividades sinistras em outras localidades. Eis uma explicação que não consegue nem ser parcial. Ela simplesmente transferiu o problema de lugar sem explicar nada. Continuamos com as bolinhas luminosas voando a velocidades acima do som sem fazer nenhum ruído.
Novas tecnologias — Por fim, admitindo uma possibilidade de intervenção extraterrestre, poderíamos levantar a hipótese de que eles de fato estão nas instalações militares do Lago Groom, mas não trabalhando em conjunto com eles, e sim observando as novas tecnologias desenvolvidas na região e vigiando os passos dos militares norte-americanos. Considerando a significativa quantidade de avistamentos de objetos anômalos em volta de áreas militares, e em lançamentos de foguetes espaciais, essa possibilidade dá o que pensar. Entretanto, se você, caro leitor, prestou atenção no que eu disse, percebeu que fechamos o círculo e voltamos ao mesmo ponto do início: não temos nenhuma prova definitiva para dizer que esses objetos são extraterrestres!
Se por um lado os pesquisadores sérios afirmam que não encontraram nenhuma evidência a favor dos ETs, por outro, o comportamento inteligente e anômalo dos objetos avistados por lá não condiz com o que nós conhecemos sobre aviões e tecnologia avançada. Independente disso, usando apenas o bom senso, pelo menos uma coisa nós podemos afirmar com certeza: utilizar essa dúvida para justificar a existência de um complô alienígena é um bocado de exagero!