A questão era um mistério ardente há décadas. Por que uma região fina e irregular da atmosfera solar, conhecida como cromosfera, apresenta temperatura muito superior à da superfície visível do astro? A resposta, recentemente proposta por cientistas, pode ser o som estelar. A temperatura na camada superficial do sol, ou fotosfera, é de cerca de 6ºC mil, muito inferior aos 15ºC milhões registrados no núcleo. Mas a cromosfera, a região imediatamente acima da fotosfera, registra picos de calor de até 11ºC mil. “É como se a temperatura subisse, em vez de cair, quando você se afasta do fogo”, diz Scott McIntosh, pesquisador do Instituto de Pesquisa do Sudoeste dos Estados Unidos, em Boulder, Colorado.
Agora, estudos de McIntosh e de seus colegas demonstram de que maneira campos magnéticos enviam ondas sonoras do interior do sol para fora, criando fontes de gás quente que dão forma e alimentam a cromosfera. Os pesquisadores compararam o fenômeno a visitar o parque nacional de Yellowstone e se posicionar entre os gêiseres musicais que irrompem de maneira aleatória, causando sons agudos e arremessando água quente em altura bastante elevada. “Existe muito mais energia em forma de onda vazando para a cromosfera solar do que estimávamos anteriormente”, disse McIntosh durante uma reunião da Associação Astronômica Norte-Americana [AAS], em Honolulu.
A cromosfera, ou esfera das cores, tem esse nome porque suas temperaturas mais elevadas fazem com que o hidrogênio do sol emita luz avermelhada. Nuvens de material da cromosfera suspensas sobre o sol podem criar um anel de fogo, de cor vermelho rubi, em torno de um eclipse solar total. A cromosfera é em larga medida responsável pela radiação ultravioleta profunda que atinge a Terra, produzindo a camada de ozônio em nossa atmosfera. A região também pode contribuir para as alterações climáticas que o planeta está sofrendo, segundo os pesquisadores. Anteriormente, os cientistas haviam proposto ondas sonoras ou os campos magnéticos em perpétua mutação do sol como potenciais causas para o inesperado calor da cromosfera. O mais recente estudo demonstra “que o campo magnético e a onda sonora caminham juntos para criar boa parte da massa e energia da cromosfera”, disse Bart De Pontieu, pesquisador do Laboratório Solar e de Astrofísica da Lockheed Martin, em Palo Alto, Califórnia, durante a reunião. O interior do sol vibra com milhões de ondas sonoras, inaudíveis aos seres humanos mas muito mais potentes do que as ondas sonoras comuns.
Essas ondas em larga medida ficam aprisionadas pela fotosfera. Usando espaçonaves, telescópios instalados na Terra e simulações em computadores, os cientistas constataram que parte das ondas aprisionadas e das energias que elas acumulam vazam para fora da camada por meio nós magnéticos na fotosfera. Os vazamentos enviam massa e energia para fora do sol na forma de pequenas fontes térmicas, que atingem a ionosfera. “O que descobrimos foi como exatamente essas ondas podem vazar do interior do sol por meio de portais magnéticos que ocorrem naturalmente”, disse McIntosh. Os cientistas presentes à reunião afirmaram que as conclusões podem ajudar os astrônomos solares a estudar outros astros. “Nós, astrônomos, observamos o sol de uma maneira especial – e é o único astro que podemos observar de maneira bastante detalhada”, diz Andrea Durpree, que já foi presidente da AAS. “As lições que estamos aprendendo com o sol”, diz Dupree, “nos acompanharão em nossa observação de todas as outras estrelas, e nos ajudarão a raciocinar para descobrir de que maneira essas outras estrelas funcionam”.
Tradução: Paulo Eduardo Migliacci ME